Sempre gostei de ensinar. Sempre gostei de transmitir
conhecimento.
Sempre gostei de aprender. Mas tudo que aprendia, eu
ensinava logo em seguida para alguém. E era quando ensinava que eu mais
aprendia. É quando explico alguma coisa para alguém, que realmente me aproprio
do assunto e o amadureço em mim.
Lembro de mim aos 7 anos, no recreio do colégio “dando aula
de ballet” para minhas colegas. Não sei se elas estavam gostando, ou se se
sentiam obrigadas ou coagidas por mim de alguma forma pela minha tirania
infantil, ou se elas estavam ali por gosto. Mas eu? Eu amava estar ali
ensinando. Apesar de ser apenas uma brincadeira no recreio, para mim não era
brincadeira.
Nas minhas brincadeiras do meu mundo de “filhice única”,
entre outros assuntos, também era professora das minhas bonecas, no caso,
minhas alunas.
Comecei a estudar ballet clássico mesmo aos 6 anos, porque
eu quis. Eu pedi. E na dança estou até hoje. Estudei a vida toda no Centro
Mineiro de Danças Clássicas e estudei também no Centro Pro Danza de Cuba (1996) e
na Palucca Schule Tanz Dresden (1996 a 1998), na Alemanha.
Quanto aos colégios? Com 9 meses fui colocada no berçário do
Jardim Azul do Colégio Imaculada, mas em anos seguintes havia uma professora
que nos colocava de castigo, era muito brava, então minha mãe me levou para o
Instituto da Criança. Depois fui para O Colibri, onde fiquei do 1º Período à 4ª
série. Tenho lindas lembranças de lá. Para fazer da 5ª série em diante fui
estudar no Colégio Marista Dom Silvério. Mas o 3º ano fiz no Colégio Método,
pois eu queria me dedicar à dança e o Dom Silvério exigia tempo demais. Me
formei no 3º ano em 1995 e fui para Cuba estudar ballet clássico em janeiro de
1996!
Em outubro de 2.000 eu tinha 23 anos e estava entre as dez
finalistas em uma audição para entrar no Grupo Corpo. Foi quando rompi o
ligamento cruzado anterior do joelho direito. Tive que parar tudo. Não fiz
cirurgia, tratei com muita fisioterapia. Foi um momento difícil de
reconfiguração da vida. Pensei em parar de dançar. Comecei a dar aulas de dança
como voluntária no Centro de Acolhida Betânia. Foi minha primeira experiência
dando aulas e aprendi muito. Fiquei um ano e meio ali.
Em seguida comecei a dar aulas em escolas de dança e
coreografar e desde então não parei mais. Em 2.002 eu já estava de
volta aos palcos.
Dei aulas de ballet clássico para crianças, jovens e
adultos. Mas já faz alguns anos que não dou mais aulas de ballet. Trabalho com
dança contemporânea e também com os workshops que desenvolvi ao longo dos anos:
Dança Contemporânea e Improvisação, Arte-Integrada, Dança da Alma e Mulheres
que Dançam como Lobas.
Sei que ainda tenho muito a aprender e consequentemente a
ensinar. Também desenvolvo laboratórios de criação. E amo fazer preparação de
elenco para espetáculos. Eu sinto um prazer imenso ao ver o desenvolvimento de
um artista, ou o entendimento sobre a arte de uma pessoa que não é artista. Já
dei workshops no Brasil inteiro, principalmente quando fiz a turnée com a Cia
Mário Nascimento através do Palco Giratório do SESC, em 2012. Ali eu comecei a
entender o que é o Brasil profundo. Ali eu comecei a vislumbrar a grandeza do
nosso país e a carência na cultura e na educação. Ali eu senti a sede de conhecimento
das pessoas do país. E vi que o SESC estava sim, cobrindo uma lacuna que era função
do governo.
Durante essa turnée dei oficinas para todos os tipos de
pessoas, em todos os cantos do Brasil. Gente de todas as idades, artistas,
não-artistas, estudantes, curiosos, apreciadores... e fui obrigada a me
comunicar. E precisei me interessar por cada um. Precisei descobrir uma forma
para que essas pessoas apreendessem algo nas minhas oficinas. E isso me
motivava também! Eu aprendi muito sobre diversidade. E sobre o quanto todas as
pessoas precisam de arte, de dança, teatro, de música, de contato uns com os
outros, de reflexões.
Desde bem pequena gostava muito de pintar e desenhar.
Sempre fui apaixonada por cores. Aos 22 anos comecei a pintar com frequência e a pintura veio
para mim como uma espécie de catarse, para equilibrar as emoções, mas também
como uma maneira de criação. A cada quadro pronto eu suspirava aliviada. É
isso. Eu sentia alívio depois de pintar. Muitas vezes eu nem queria pintar, mas
vinha uma necessidade do corpo, do coração, da alma, e eu pintava
compulsivamente e muito rápido, até poder sentir o alívio.
Em períodos que escrevo mais, curiosamente não pinto, e vice-versa. Na verdade, já tem alguns anos que escrevo bastante e deixei a pintura meio de lado. Também andei coreografando muito. Parece que ou faço uma coisa, ou faço outra.
Em períodos que escrevo mais, curiosamente não pinto, e vice-versa. Na verdade, já tem alguns anos que escrevo bastante e deixei a pintura meio de lado. Também andei coreografando muito. Parece que ou faço uma coisa, ou faço outra.
Em 2006 machuquei o joelho direito pela segunda vez. Eu
dançava no Balé da Cidade de São Paulo na ocasião. Pedi demissão e quis voltar
para Belo Horizonte. Fiz a cirurgia e levei dois anos para me recuperar e mesmo
assim, não voltei a ser como antes. Durante esses dois anos tentando me
recuperar, fui ficando extremamente deprimida. Sonhava que dançava todas as
noites. Comecei a pensar que não conseguiria mais voltar a dançar. Por isso fui
fazer o curso livre de pintura com a Patrícia Leite, na Guignard. Também fiz
vestibular na UFMG para a graduação em Teatro. E foi quando conheci o Odin
Teatret, dirigido por Eugênio Barba e comecei a estudar com eles, participando
de seus workshops.
Bem, a vida seguiu e felizmente em agosto de 2008 eu estava
estreando um trabalho com a Cia Mário Nascimento, chamado Faladores, que fez
muito sucesso. Para este trabalho comecei a estudar canto, pois ele requeria
uma habilidade para emitir sons vocálicos que eu precisava desenvolver. Acabei
estudando 7 anos de canto com a professora Bárbara Penido, o que muito me
acrescentou artisticamente. Abandonei o curso da UFMG, devido às turnées e
compromissos com a Cia MN.
Mário Nascimento teve fundamental importância na minha
recuperação e juntos desenvolvemos uma nova forma para que eu pudesse me
expressar através da dança. Ele me ajudou a descobrir novos caminhos e
possibilidades com meu corpo. Foi quando comecei a agregar à dança, o teatro
físico e a voz como instrumento do corpo. Foi quando comecei a desenvolver o
curso de Arte-Integrada. Nada nasce do nada. Cada fato da vida nos conduz ao
próximo fato, à próxima escolha. Nós vamos nos construindo, destruindo,
reconstruindo, caindo, levantando, nos redesenhando, nos recolorindo, nos
reconfigurando.
Em 2014 fiz o curso de desenho de observação com a
professora Letícia, também na Guignard (acho que foi minha “Mulher Selvagem”
que me conduziu para isso). Também em 2014 fui para o Odin Teatret, em
Holstebro, Dinamarca, fazer uma imersão para que a atriz Roberta Carreri me
dirigisse em meu novo solo “A Mulher que Cuspiu a Maçã”. Eu já havia feito
workshops com eles algumas vezes, mas dessa vez tive um contato mais profundo,
como Mestra (Roberta) e discípula (eu). Isso me impactou muito. Além disso, observei como cada
ator e atriz do Odin Teatret criou uma metodologia de ensino mas com uma
filosofia de ensino em comum. Sem dúvida que isso para mim se tornou inspiração
e um modelo a ser seguido. O trabalho com o Odin e mais especificamente com a
Roberta Carreri me transformou e deu alicerces para a minha vida.
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Há alguns anos tenho como meta do ano fazer o vestibular
para a Guignard, mas eu desistia, deixava para lá.
Final de 2018 decidi fazer. Meu marido me incentivou
bastante. Acho que ele percebia que só faltava um empurrãozinho.
Parando para analisar minha trajetória até aqui, agora com
41 anos de idade, optei por fazer Licenciatura. Poderei me qualificar mais para
ensinar. Vou aprender mais sobre a arte de ensinar. Além disso, caso surja
alguma situação onde seja exigida alguma comprovação formal a respeito da minha
capacitação para ensinar, eu terei esta formalidade concluída. E o curso ainda
oferece todas as possibilidades do bacharelado, posso escolher matérias e
ateliês que mais me interessem.
Acredito que o conhecimento que vou adquirir aqui será um
casamento perfeito com a bagagem que trago da dança, do teatro e da música.
Vejo a Arte como uma coisa só. Uma grande energia que se expressa de várias
formas através de nós, artistas. Quanto mais nos qualificamos, adquirimos
técnicas, conhecimento, mais podemos nos abrir para servir à Arte. Para
servirmos através da Arte. A Arte em si. E à arte de ensinar Arte.
Rosa Antuña